Acabaram-se as dúvidas. Lance Armstrong confessou. Tomou doping. Assumiu-o. Foi até mais longe do que aquilo que eu poderia pensar. Admitiu que o fez desde o início da sua carreira e que as sete vitórias no Tour, foram todas elas sob efeito de doping. Enganou-me. Traiu-me e, mais do que tudo, pôs uma modalidade no lodo. Lodo esse, diga-se, em que ela já "nadava" a algum tempo, por casos semelhantes, muitos deles oriundos de uma geração (existirão, certamente, honrosas excepções), onde essa prática era considerada "normal" e aceite por quase todos no "pelotão".
Mais vale tarde do que nunca? É verdade. Assumir um erro, fica sempre bem e, de certa forma, acaba sempre por dar uma dimensão mais humana a quem, durante anos, agiu friamente, não olhando meios para alcançar os seus fins (ideia reforçada pelo próprio). A mentira alimentou financeiramente muita gente? Também é verdade. Marcas, imprensa, fundações, etc, foram alimentadas por ela. Até Oprah e a televisão onde o seu programa é exibido, ganharam com o desmascarar da mesma. Vão devolver o dinheiro, todos os que ganharam com a mentira? Certamente que não e muitos deles vão até exigir mais dinheiro ainda, por verem os seus nomes associados a Lance e por, alegadamente, terem sido enganados todos estes anos.
Tudo isto, é verdade, mas mesmo assim, parece que continua a não ser verdade para todos. Como amante da modalidade, no Facebook estou associado a muita gente ligada ao ciclismo, desde actuais e ex-ciclistas, a páginas de equipas, a directores desportivos, jornalistas, comentadores, etc, e fico, sinceramente, perplexo com a forma como reagem a todo este caso. Que antes de Armstrong confessar, eu ainda admitisse que houvessem dúvidas, eu aceito. Eu próprio as tinha, apesar de nos últimos meses, as mesmas terem sido quase dissipadas. Agora depois de tudo o que pudemos ouvir na entrevista de Lance, ainda haver gente a desculpabilizá-lo, faz-me sinceramente confusão e faz-me questionar até que ponto essas pessoas querem realmente um ciclismo limpo, dentro daquilo que é permitido numa modalidade de extrema exigência como esta o é.
Já li que o Armstrong deu dinheiro a ganhar a muita gente (é verdade, mas não terá ele ganho muito também?). Já ouvi que devemos valorizá-lo, não por esta questão, mas sim pela luta contra o cancro (toda esta ideia de luta contra o cancro, não foi suportada pela ideia de alguém que depois de ter a força de curar um cancro, voltou ainda mais forte e conseguiu tornar-se um vencedor desportivo?). Já li que era um pelotão de "dopados" e que ele era só mais um (se quem me rodear roubar e eu roubar também, não serei também eu um ladrão?). Já li que são pedidas coisas humanamente impossíveis aos ciclistas e que a "sobrevivência profissional", faz com que haja a tentação de sucumbir a estes comportamentos (é verdade e eu já o escrevi aqui, anteriormente). Enfim, já li e ouvi muita coisa a desculpabilizar Armstrong, como se ele afinal fosse o "coitadinho" desta questão, por parte de pessoas com responsabilidade, algumas delas referências na modalidade a nível nacional. Honra seja feita a Joaquim Gomes (vencedor de duas Voltas a Portugal e actual director da mesma), que foi o única pessoa directamente ligada a modalidade, que eu ouvi a ter um discurso duro com Lance e com os próprias autoridades que regem a modalidade (concordo que não pode ser só uma cabeça a rolar) e que foi até mais longe ao admitir, que ainda hoje, apesar de um muito maior controlo, continuam a haver algumas mentalidades na modalidade, que continuam a mover-se com base no "vale tudo" para ganhar.
Lance Armstrong, enganou o ciclismo, enganou os seus fãs e enganou aqueles que ainda acreditam que podem haver heróis e referências. Mais do que tudo, enganou aqueles que acreditaram numa história maravilhosa ("perfeita", citando-o), em que alguém vence uma doença horrível e depois disso ainda consegue tornar-se num dos maiores desportistas de todos os tempos. Pelo contrário, tudo não passou de uma fraude. Aqueles que usam a pulseira Livestrong no pulso, como se sentirão hoje?
Quem gosta de ciclismo a sério, puro e limpo, não pode defender ou desculpar tamanha fraude. Agora, resta ao ciclismo tentar capitalizar o lado bom desta declaração de Lance. Que sirva de reflexão sobre a mentalidade das pessoas que o campõem. Que sirva para perceber, também, que não se pode exigir a humanos, coisas desumanas, em nome de audiências e contratos. Mas que, acima de tudo, sirva para os directores desportivos e ciclistas profissionais aprenderem que quem "alimenta" a modalidade, são os adeptos. E esses nunca podem ser enganados, em circunstância alguma.
concordo contigo, mas se tiram os títulos a armstrong vão dá-los a quem? Ao 2º e 3º classificado que provavelmente também andavam dopados?! Sem dúvida, Lance merece ser culpabilizado mas então se culpam um tem que culpar os outros também! Vão alegar que os outros não deram positivo em nenhum teste anti-doping, mas o lance também passou sempre nos testes (alegadamente). Quem devia ser o maior prejudicado desta novela deveria ser a entidade que faz os testes anti-doping por ter deixado passar este e tantos outros casos(na sua maioria não descobertos) e colaborar com este esquema!
ResponderEliminarDaniel, sinceramente, nem estou muito preocupado com quem vão ficar as vitórias que eram do Lance. Se ele confessou doping e se, mesmo antes dele o fazer, já lhe tinham sido retirados os títulos, certamente eles teriam que ficar entregues a quem ficou em 2º. Obviamente que ninguém, nem mesmo aqueles a quem foram atribuidos essas vitórias, dá valor a vitórias conseguidas na "secretaria". Agora se ficou provado que ele ganhou as 7 Voltas a França dopado, ele teria que ser punido e não poderia ficar com esses titulos. Se os outros também estavam dopados? É possível que sim. Aliás, alguns deles já foram punidos também por isso, ao longo dos últimos anos. Se analisares bem, alguns dos títulos que o Armstrong ganhou, nem sequer foram atribuidos ao 2º classificado, mas sim ao 5º ou ao 6º, pois também com esses ciclistas ficou provado que estes recorreram a doping. Tem que haver um castigo pesado e tem que haver consequências e concordo contigo que mais cabeças deveriam rolar, nomeadamente, das autoridades que durante estes anos fizeram testes anti-doping e das autoridades que regem o ciclismo mundial (ainda mais, se ficar provado que estas esconderam algum controle positivo...). O mais importante, é que no futuro esta mentalidade vá desaparecendo do ciclismo e do desporto em geral. O que não é fácil, diga-se. De qualquer modo, há que lutar por isso.
EliminarAbraço :)