terça-feira, 19 de outubro de 2010

Doping: Muito Mais Que Batota

Gosto muito de ciclismo. A par do futebol é, sem dúvida, a minha modalidade favorita. Acompanho as diversas competições de estrada ou de BTT e, semanalmente, gosto de dar a minha voltinha, uma ou duas vezes, consoante a disponibilidade.

Mas o ciclismo está mal. Mais propriamente, a imagem da modalidade. A causa todos sabemos: o doping. Qualquer pessoa, nomeadamente, os que não têm uma ligação à modalidade, associam o ciclismo a fraude e à batota. Não é raro acontecer-me, estar a ver uma competição de ciclismo na televisão, e a meu lado estar alguém a fazer comentários do género "cambada de drogados" ou outros com igual intenção. Normalmente, costumo rebater esses comentários, explicando que o ciclismo é a modalidade mais controlada e que, em prejuízo da mesma, os casos são denunciados pelas entidades que o regulam, mesmo aqueles que envolvem as grandes figuras do ciclismo nacional e mundial. Mas convenhamos, que a minha luta (e a de outros) para defender a modalidade, é infrutífera, quando todos os dias surgem notícias de novos casos, alguns deles, envolvendo as figuras maiores dos ciclismo mundial.

Na minha opinião, penso que o problema do doping no ciclismo, tem como como principais culpados aqueles que se dopam, ou seja, os ciclistas. Contudo, e não querendo minimamente absolver os ciclistas que o praticam, a questão do doping, vai muito mais além, do que a simples e pura batota. Quem vive do ciclismo profissional, tal como noutra profissão (bem, em alguns casos não será bem assim...), precisa  de atingir objectivos e resultados. O ciclismo profissional vive de patrocínios e esses patrocinadores querem vitórias e a, consequente, visibilidade para as suas marcas. Se isso não suceder, o patrocínio acaba... A crise que vivemos, veio acentuar ainda mais esta questão, fazendo com que muitas equipas acabassem e, por consequência, muitos ciclistas ficassem sem colocação no pelotão profissional. Isto, obviamente, provoca que a competição para estar ao mais alto nível, seja ainda mais voraz, obrigando os ciclistas a estarem no seu melhor, mesmo quando não estão na realidade. E às vezes o melhor não chega... Ora, se um deles se "dopa" e obtém resultados, os outros, para atingirem esses mesmos resultados e, sobretudo, para ganharem a vida, caem na tentação de fazer o mesmo... E assim se forma um círculo vicioso. A própria forma como as competições decorrem, nomeadamente, a cada vez maior dureza das etapas (muitas vezes, para aumentar as audiências televisivas), são outras das causas do problema.

Claro que esta é uma forma muito redutora de abordar a questão. Muitas mais razões podem ser explicitadas. Mas o que quero dizer é, exactamente, que o problema é muito complexo e profundo. Diria que é uma mentalidade instalada no universo do ciclismo profissional, envolvendo ciclistas, directores desportivos e médicos (estes dois últimos, com tanta ou maior culpa que os próprios ciclistas), que é necessário abordar e entender, de forma a atacar o problema de frente.

Todos estes casos de doping "matam" verdadeiramente o ciclismo. Como poderão os adeptos acompanhar e acreditar numa prova de ciclismo, sabendo no final da mesma, que o vencedor estava "dopado"? Quais são os patrocinadores, que querem estar ligados a uma modalidade, que é percepcionada pelo público em geral, como uma modalidade de batoteiros e sem verdade desportiva? As respostas parecem-me óbvias...

Como adepto de ciclismo e como alguém que ainda acredita na modalidade, espero, sinceramente, que a questão fulcral deste problema, seja analisada e que, no futuro, a imagem do ciclismo mude para melhor. Caso contrário, o futuro será triste...

PS: Apesar de tudo, também existem situações em que as autoridades competentes e a própria comunicação social, devem ter algum cuidado na forma como as divulgam e informam. Refiro-me a casos em que, ao que parece, não houve de todo intenção por parte dos atletas em tomarem algo de ilícito.

Exemplos disso, são os casos de Mário e Rui Costa e da betetista Joana Barbosa, que ao ingerirem um suplemento legal e autorizado pela UCI, mas que se encontrava contaminado por uma substância proibida, tiveram controlos posítivos. Parece-me claro, se eu for ao supermercado comprar um produto e, de seguida, o ingerir, não poderei ser eu o culpado pelo facto, desse mesmo produto, estar contaminado com uma substância ilegal. Aliás, pelo que li, as próprias autoridades já confirmaram a contaminação do referido suplemento que, repito, era autorizado pelas mesmas, tendo já surgido mais controlos positivos, devido a esta mesma contaminação. Parece-me que nestes três casos, a inocência é óbvia.

O próprio caso de Contador, também suscita dúvidas. Independentemente, da intencionalidade ou não do ciclista espanhol em "dopar-se" ( e que deve, obviamente, ser avaliada), sinceramente, não me parece ,que uma substância detectada numa concentração de 0,00000000005 g/ml (ao que tudo indica, muito abaixo dos valores que podem afectar o rendimento físico) seja motivo para castigo.

Pede-se rigor mas, ao mesmo tempo, bom senso.

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